sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Os Elementais - Capítulo 3

Olá leitores!
Já faz um bom tempo que não posto aqui no blog por motivos pessoais, mas hoje decidi deixar um texto para vocês ^^
Deixo aqui o terceiro capítulo da série "Os Elementais", Boa leitura ;]



Perdão


Era uma floresta densa, tão cheia de árvores que parecia difícil respirar, o chão tinha tantas folhas que não era possível ver a cor do solo, a copa das árvores bloqueava a luz do sol deixando uma estranha sensação de anoitecer e era demasiadamente silenciosa.
Ethan descansava encostado em uma enorme pedra. Hórus piava freneticamente em seu joelho tirando sua paciência enquanto ele analisava mais uma vez o medalhão, que desde o último encontro se mostrou ser bem útil.
Ele pulsava quando Ethan tentava fazer algo errado e ardia de um modo estranhamente confortável quando Ethan pensava em desistir, Ele produzia também, algumas visões que lhe indicavam certos caminhos ou decisões a serem tomados para encontrar o próximo Elemental. Mas agora simplesmente parara de “funcionar”.
Os pés de Ethan latejavam. Ele havia caminhado por várias horas floresta adentro na esperança de que Hórus avistasse algo, mas o pássaro mal podia vê-lo debaixo do denso dossel. Então fez-se claro o motivo que fazia Hórus estar tão inquieto.
- Achou algo, não foi? Não me avisou antes porque só me viu quando te chamei, não é?
O falcão piou e abriu as asas alegre por ser compreendido. Ethan sorriu sem mesmo saber o que ele havia achado e disse:
- Mostre-me!
Ele voou e pousou numa grande árvore ali perto, olhou além e chamou pelo dono. Este levantou e foi ligeiro ao seu. O medalhão começou a pulsar...
Um pequeno espaço aberto ali continha um obelisco. Era enorme e desgastado, parecendo velho. Tinha pedras incrustadas em toda sua estrutura, várias esmeraldas, e havia também algo escrito no meio. Ethan leu em voz alta:

“Não são necessárias memórias para um bom coração,
Pois tem de descartar as lembranças para se praticar o perdão...”

Então o ar do ambiente mudou. Os poucos sons do vento balançando as folhas cessaram assim que a voz de Ethan parou de falar. Hórus voou para seu ombro e olhou para o obelisco curioso, e se assustou quando o obelisco deu um estalo estrondoso.
Uma rachadura fina partiu o monumento em dois, soltando um vento tão forte que quase fez Ethan cair, as plantas que o cobriam levitaram graciosamente pousando no chão e o obelisco foi se abrindo onde havia rachado vagarosamente. Como de costume, ali havia um corredor. Era um caminho entre as árvores e não era possível ver o seu fim devido a uma densa névoa que havia lá dentro. As plantas do corredor continham várias pedras saindo de seus troncos e estas reluziam num verde agradável. Ethan percebeu que não eram as únicas.
Ele enfiou a mão na gola e tirou o medalhão que pulsava descontroladamente e puxava para frente com força. O espaço abaixo da pedra do fogo também reluzia como as pedras, porém bem mais forte que elas. Ele deu um puxão, Ethan vacilou e o soltou, e se adiantou assustado para recuperá-lo, mas ele não seguiu adiante, apenas parou.
O medalhão deu um pulso violento e então parou de pulsar, e ficou ali no ar, parecendo vencer a força gravitacional. Ethan estendeu o braço para pegá-lo, mas ele se afastou, Ethan tentou de novo, mas ele se afastou mais uma vez, e ele tentou mais umas vezes para perceber que o medalhão ia guiá-lo ali.
Ele começou a andar e parou, olhou para o ombro, refletiu e disse:
- Não acho que há perigo de te trazer desta vez, mas não saia do meu ombro.
Hórus pareceu se encantar, piou alegre e deu uma bicadinha carinhosa na orelha do dono, e então Ethan prosseguiu.
Quanto mais adentravam no caminho, mais densa ficava a névoa enquanto o medalhão os guiava nas bifurcações. Ethan estranhou não ser um caminho reto e simples desta vez, mas parou de se questionar para prestar atenção no medalhão quando a névoa deixou visível apenas o brilho que ele emitia.
Ethan percebeu que o medalhão não virava mais, indo sempre em frente, percebeu também que os raios de sol, mesmo com a densa névoa, chegavam fraquinhos até ali, não deviam mais estar na floresta. Quando ele se perguntou onde estariam, o medalhão parou.
Ele circulou Ethan e parou em sua frente, então girou devagar fazendo sua corrente enrolar em torno de si e quando ela finalmente se enrolou por completo, ele girou para o lado contrario.
Foi um giro forte, Ethan e Hórus se assustaram, a corrente se desenrolou com tal força que lembrou um chicote, e continuou girando como uma hélice. Um vento continuo saiu dali afastando a névoa ao redor, e a medida que ela saia de perto, parecia se fazer mais rarefeita, e o medalhão continuou o movimento até a névoa passar por completo.
Foram necessários alguns segundos para os olhos de Ethan se adaptarem a intensa luz do sol que se manifestava livre agora, e quando ele os abriu, ele simplesmente desejou não ter aberto.
Estavam numa plataforma de rocha pairando no que lhe parecia não ser nada. Ethan se aproximou da borda e olhou para baixo e ficou confuso, não viu nada, apenas o infinito azul celeste, que se estendia igualmente para cima, ele olhou para o medalhão e ele estava parado ali, apenas reluzindo, e se sentiu, pela primeira vez, estranhamente perdido, sem rumo.
Ele então voltou até o meio da plataforma e esperou, olhou para Hórus e este não estava alarmado, uma vez que não entendia o que se passava. Deixou Hórus voar, mas ele nem se moveu, parecia estranhamente satisfeito com o simples ombro do dono.
O medalhão Então recomeçou a pulsar, como um coração que gradualmente acelerava, e quando a plataforma aos pés de Ethan já estava tremendo de tal modo que ameaçava se romper, o medalhão parou e pulsou apenas uma única e característica vez. Ele chegara...
Um vento forte e continuo passou por Ethan se dirigindo a sua frente, se espiralando em frente à plataforma no que dava a impressão de ser um futuro tornado. E assim o foi.
O furacão imenso se estendia para cima e para baixo uniformemente, sem deixar suas extremidades aparentes, porém não arrastava os dois em sua direção.
- Calma, está tudo bem... – Disse Ethan a Hórus sem conseguir conter a própria preocupação.
E assim como surgiu, ele cessou numa brisa tranquila, revelando enfim o Elemental. Era um homem desta vez. Era alto e trajava uma calça junto a uma camiseta regata, ambas verdes e combinando com seu cabelo curto simples. Tinha o físico de um atleta, aparentava ser muito veloz. Demonstrava alegria e bondade no olhar.
- Ethan! Que agradável encontro! Como vai?
- Eu... Ah... Vou bem, obrigado. E você? – Perguntou por educação.
- Estupendo! E... Ah sim, caprichos! – Disse ele olhando para a plataforma.
Ele fechou o punho com firmeza na altura do rosto e abriu a mão num gesto rápido que cortava o ar a sua frente descrevendo uma diagonal, e a plataforma simplesmente se desfez transformando-se em ar. Ethan gritaria, mas o desespero foi tamanho que ele simplesmente congelou e caiu por alguns centímetros, Hórus saiu ligeiro do ombro do dono também assustado, mas ele não caiu.
Flutuava livremente ali, assim como o pequeno gavião e o Elemental. Era uma estranha e prazerosa sensação de liberdade, e demorou alguns segundos descrevendo círculos no ar, até se lembrar do Elemental ali, que ria da situação. Hórus o fitava curioso.
- Hahaha! É ótimo não? Enfim, vamos aos deveres... – Ele ficou sério.
- Ah... Claro, desculpa. – E voltou ao seu lugar.
- Como já deve ter percebido Ethan, sou o Elemental do Ar, e como minhas irmãs, tenho uma mensagem valiosa para te passar hoje, entretanto, antes disso eu acho que estou livre para saciar um pouco de suas curiosidades.
Ele não esperava esse mérito tão cedo, ficou surpreso.
- Sério?
- Sim.
- Bom... há uma pergunta que eu queria fazer há tempos... Porque eu? – Não hesitou.
- Suspeitei que perguntaria isso. Ethan, nós observamos vocês há muito tempo, mais do que o suficiente para ver seus erros, e nos envergonhamos muito destes. Um desses erros nos chama mais a atenção. Vocês vivem num planeta com várias outras espécies de seres vivos e foram a única que recebeu a dádiva da inteligência para deixar de sobreviver e começar a viver. Ainda sim não agem certo. Vocês são injustos, vivem em função de riquezas materiais e tiram vantagem de outros para isso. Negam a ajuda a quem precisa, tapam os ouvidos para as súplicas. Parecem acreditar que toda essa frieza e individualidade os levarão ao progresso, sem perceber os problemas que já foram criados por essas atitudes! Comportamento tal que nenhum dos outros seres vivos ostenta mutuamente. Mas você se diferencia, imagina o porquê?
- N... Não, nenhuma idéia.
- Você decidiu seguir sua vida independente dos outros. Você viaja o mundo em busca de pequenas relíquias com algum valor e as vende apenas para poder viajar para outro lugar e fazer o mesmo. Viajar para sentir a intensidade dos momentos, conhecer pessoas e as guardá-las no coração, aprender culturas e se tornar mais compreensivo. Se tornou um lutador por opção buscando equilíbrio entre corpo e alma e espalha o respeito adquirido em suas lutas, percebeu que a palavra sempre vence o golpe e é uma pessoa resistente aos impactos da vida. Você simplesmente vive Ethan. O fato de viver assim abriu novos modos de ver a vida em sua mente, e uma pessoa que possui uma mente restrita e teimosa não poderia cumprir sua missão.
- Chego a achar que eu também não darei conta dela...
- Não se esqueça da ultima mensagem que ouviu de nós. E nos perdoe por lhe dar um fardo tão pesado. E é sobre isso a mensagem que irei lhe transmitir.
- Minha responsabilidade?
- Não. Falarei sobre o perdão Ethan...
Ele ficou surpreso, pois achava que o motivo que eles usaram para escolhê-lo, era o que Ethan achava que o fazia insignificante. Sempre se sentiu inútil ao mundo, uma vez que levava uma vida simples e individual, sem muitas relações com outras pessoas.
- Perdão... Parece simples de compreender, mas complicado de realizar...
- Exato. Talvez seja por isso que as pessoas decidiram abandoná-lo ultimamente... Conseguem despertar mais pena que repulsa com essa ignorância toda. As pessoas não perdoam mais, pelo menos não de coração, tornando-se cada dia mais rancorosas. Iludem-se pelo orgulho achando que ficarão melhores descartando de suas vidas aquelas pessoas que cometeram um erro com elas. Perdem amigos e familiares por tratá-los com intolerância, ao invés de dá-los uma segunda chance. A confiança no próximo, assim como um cristal, nunca volta a ser o que era uma vez que é quebrada, deve ser tratada com cautela, mas não deve ser deixada de lado pelas suas fissuras. Essa jóia no coração de quem permite, nunca deixa de ter o mesmo valor sentimental. Tem que dar a nova chance para que se tome o outro caminho, já que o erro já foi cometido. Não se esqueça de que se nós não houvéssemos perdoado os erros de toda uma espécie, vocês não estariam diante de uma chance de se recuperar, entende?
- Sim.
- Espalhe o perdão entre os seus iguais Ethan, deixe de achar que as pessoas agiram errado porque cometeram um deslize, o ponto de vista do outro nunca é igual o seu, não cabe a você julgar qual atitude é certa ou não para os outros sem antes ter cometido o mesmo deslize, e se já cometeu, vai querer ensinar o caminho certo a quem o iniciará agora! Amai o próximo como ama a si mesmo, para ter compaixão e assim ser compreensivo, e quando for compreensivo saberá ver a vida pelos olhos de outro para aprender a perdoar. Seja como o ar, que por mais que possa se enfurecer pelos maus tratos do meio ambiente e se transformar em severas tempestades, sempre se acalma no fim, dando aos seres humanos todo o auxílio que podem tirar deste.
- E assim farei. Mesmo que complicado, meu objetivo será cumprido.
- Ah! Então nos perdoa por isso?
- Não perdôo, pois não tenho o que perdoar – Disse sorrindo.
- Fizemos bem em escolher você Ethan. Me despeço aqui. Boa sorte em sua jornada.
Ele estendeu a mão fechada e a abriu para baixo, deixando cair o medalhão, que agora continha uma pequena pedra verde acompanhando as outras duas. Só agora Ethan perceberá que o medalhão havia sumido previamente.
O Elemental levantou a mão direita e fechou os olhos, uma densa névoa começou a se formar, Hórus correu para seu ombro e quando Ethan não via mais nada seus pés tocaram o chão. O medalhão, que ainda flutuava a distancia em que o Elemental o deixara cair emitiu um pulso que afastou a névoa.
A sua frente um enorme precipício se estendia horizontalmente sem fim aparente, com uma ponte pênsil partindo dali para dentro de um nevoeiro denso. Atrás estava o caminho entre as árvores que Ethan reconheceu ter tomado quando entrou pelo obelisco. Era óbvio seu destino ali. Ele recolheu o medalhão e seguiu em frente.

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